Jurisprudência

Execução Fiscal. Multa Ambiental. Executado falecido antes da inscrição na dívida ativa e da propositura da execução

TJSP
Execução fiscal

EXECUÇÃO FISCAL MULTA AMBIENTAL EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE EXECUTADO FALECIDO ANTES DA INSCRIÇÃO NA DÍVIDA ATIVA E DA PROPOSITURA DA AÇÃO REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO IMPOSSIBILIDADE (SÚMULA 392 DO STJ) EXTINÇÃO DO FEITO ILEGITIMIDADE DE PARTE RECONHECIDA EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE ACOLHIDA SENTENÇA MANTIDA RECURSO NÃO PROVIDO. Tendo em vista a execução fiscal ajuizada contra devedor já falecido, o processo deve ser extinto por ilegitimidade de parte com fulcro no art. 267, VI, do CPC, não havendo como a demanda prosseguir contra os sucessores, vez que o redirecionamento do feito pressupõe que a relação processual tenha sido constituída com o preenchimento das condições da ação e dos pressupostos processuais, o que não se verifica no presente caso, uma vez que não é devida a substituição da CDA para a inclusão dos sucessores no polo passivo da execução, não se tratando, pois, de mero erro formal ou material, mas de alteração do próprio lançamento, pelo que se impõe o acolhimento da exceção de pré-executividade com o fim de extinguir a demanda executiva. EXECUÇÃO FISCAL MULTA AMBIENTAL EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE VERBA SUCUMBENCIAL DEVIDA. Comprovado o exercício de defesa, são devidos honorários advocatícios, com fulcro no art. 20 do Código de Processo Civil.  (TJSP;  Apelação Cível 0021696-90.2005.8.26.0625; Relator (a): Paulo Ayrosa; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de Taubaté – SAF – Setor de Anexo Fiscal; Data do Julgamento: 29/08/2013; Data de Registro: 04/09/2013)

EXECUÇÃO  FISCAL   MULTA  AMBIENTAL   EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE VERBA SUCUMBENCIAL DEVIDA. Comprovado o exercício de defesa, são devidos honorários advocatícios, com fulcro no art. 20 do Código de Processo Civil.

Relatório

ESPÓLIO DE BENEDITO HILÁRIO DE OLIVEIRA, nos autos da execução fiscal que lhe move FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, apresentou exceção de pré-executividade objetivando o reconhecimento da ilegitimidade passiva de parte por ter sido a infração ambiental perpetrada pelo devedor falecido antes da inscrição na dívida ativa, a qual foi acolhida pela r. sentença de fls. 118/122, motivando este recurso.

Inconformada, alega a exequente que a r. sentença desconsiderou o teor do art. 1997 do CC e contrariou o art. 133 do CTN, que permite a cobrança de dívidas do espólio, sem afastar a multa, mencionando apenas as dívidas, as quais devem ser suportadas pelo espólio antes da partilha. Aduz que o arrolamento dos bens do falecido ainda está em andamento, havendo inclusive outra habilitação de crédito nele, devendo responder o espólio pela dívida perpetrada pelo falecido, tendo inclusive requerido a exclusão da viúva e não do espólio, que já integrava a lide, além do fato de que o pedido de arquivamento do feito não implica em reconhecimento nem aceitação dos termos da exceção. Pugna, ademais, pela exclusão da verba sucumbencial por se tratar de mero incidente processual e não haver previsão de imposição de sucumbência em tais incidentes, além de tal verba não ter sido pedida inicialmente, razão que leva ao provimento recursal.

O recurso foi respondido (fls. 138/139).

É O RELATÓRIO.

Voto

Conheço do recurso e lhe nego provimento.

Conforme se depreende dos autos, a Fazenda Estadual ajuizou execução fiscal em face de Benedito Hilário de Oliveira fundada na Certidão de Dívida Ativa nº 041574, inscrita em 03.10.2005, referente a multa aplicada pela Secretaria do Meio Ambiente com base no AIIM nº 110443, lavrado em 18.04.2001, por supressão de vegetação secundária nativa em estágio pioneiro de regeneração, em área de preservação permanente, sem licença ambiental exigível e em desobediência ao que estabelece o art. 2º, letra “a”, item 1 e letra “c” da Lei nº 4.771/65, cujo valor é de R$ 1.717,03 (fls. 03).

Determinada a citação, constatou o Oficial de Justiça que o executado havia falecido em 1º de janeiro de 2005 (10.03.2006 fls. 06), razão que fez a exequente pretender a inclusão no polo passivo do espólio de Benedito Hilário de Oliveira, entendendo, no entanto, não se tratar de caso de substituição da CDA (fls. 26), o que foi deferido (fls. 37), tendo sido o espólio citado em 08.07.2009 (fls. 41).

Em seguida, requereu a exequente a suspensão do feito por 60 dias (fls. 66), que a viúva meeira pagasse o débito apontado (fls. 69) e, após a intimação, a suspensão do feito por mais 90 dias (fls. 78) e por mais 120 dias (fls. 81). E diante da negativa de pagamento do débito pela inventariante, requereu a penhora no rosto dos autos (fls. 86), dando ensejo à apresentação, pelo espólio, de petição recebida como exceção de pré-executividade,  pleiteando a extinção da execução com base na ilegitimidade passiva de parte pela impossibilidade de transferência da cobrança de penalidade dos herdeiros e espólio quando a execução fiscal fora proposta contra o de cujus após o falecimento (fls. 90), requerendo, após, a condenação da exequente em arcar com as verbas sucumbenciais (fls. 101/106).

O MM. juiz a quo, entendendo ser o espólio parte ilegítima para responder pela execução, acolheu a exceção de pré-executividade para extinguir o feito com base no art. 267, VI, do CPC e art. 26 da Lei de Execução Fiscal, condenando a excepta no pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor atribuído à causa (fls. 122). E com razão, a meu ver.

De proêmio, reputo necessária uma digressão acerca da natureza da Certidão de Dívida Ativa para o deslinde do feito. Nessa aspecto, vê-se que a CDA consiste no documento que legitima a propositura da execução fiscal, isto é, trata-se do título que aparelha a execução, tornando possível a satisfação do crédito tributário, resultando, assim, dos atos de lançamento e inscrição em dívida ativa.

O lançamento, conforme o art. 142 do CTN, é definido como procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido e identificar o sujeito passivo. Ou seja, apura-se, basicamente, o quantum debeatur e o an debeatur.

Após o ato de lançamento, o sujeito passivo é notificado, podendo extinguir o crédito tributário pelo pagamento, impugnar o lançamento (dando início, assim, ao processo administrativo) ou, ainda, ignorar o lançamento, quando se dará a constituição definitiva do crédito correspondente após o esgotamento do prazo de 30 dias contados de sua notificação. De qualquer sorte, finalizado o processo administrativo de impugnação ao lançamento ou transcorrido o prazo de 30 dias para manifestação do sujeito passivo, dá-se a constituição definitiva do crédito tributário, que se torna imutável na esfera administrativa, sendo consequência disso a inscrição em dívida ativa, que consiste, fundamentalmente, no ato de aferição dos pressupostos legais e da presença dos requisitos essenciais para a validade e eficácia do título executivo a ser formado “ato de controle administrativo da legalidade”, nos exatos termos  do art. 2º, §3º, da Lei nº 6.830/80 , caracterizando, assim, a consolidação do débito perante a Fazenda Pública.

Sobre tal aspecto, ensina Paulo de Barros Carvalho:

“A inscrição em dívida ativa é o único ato de controle de legalidade, efetuado sobre o crédito tributário já constituído, que se realiza pela apreciação crítica de profissionais obrigatoriamente especializados: os Procuradores da Fazenda. Além disso, é a derradeira oportunidade que a Administração tem de rever os requisitos jurídico-legais dos atos praticados. Não pode modifica-los, é certo, porém tem meios de evitar que prossigam créditos inconsistentes, penetrados de ilegitimidades substanciais ou formais que, fatalmente, serão fulminados pela manifestação jurisdicional que se avizinha” (in “Curso de Direito Tributário”, Ed. RT, 15ª ed., pág. 537).

Posteriormente ao ato de inscrição em dívida ativa é que se emite a Certidão de Dívida Ativa, título representativo do débito perante o fisco, o qual, como se disse, legitima a propositura da execução fiscal.

Logo, é de se concluir que a Certidão de Dívida Ativa nada mais é que a consequência da inscrição em dívida ativa, devendo conter, por isso, todos os aspectos materiais e formais desta, isto é, “devedor”, “quantia devida”, “origem/natureza”, “data de inscrição” e “número do processo administrativo”, se houver.

No entanto, o CTN, por meio de seu art. 203, assim como a própria Lei de Execução Fiscal (art. 2º, §8º), consagram a prerrogativa especial da Fazenda Pública consistente na possibilidade de substituição da certidão da dívida ativa no curso do processo de execução fiscal, na hipótese da necessidade de se corrigir eventuais falhas ou omissões concernentes à transferência dos dados do crédito tributário para a dívida ativa ou da dívida ativa para a respectiva certidão, tratando-se, pois, de suprimento de irregularidades meramente formais, porquanto o crédito tem de estar, por óbvio, regularmente constituído.

Não é por outra razão que se condensou o entendimento jurisprudencial, cristalizado na conhecida Súmula 392 do STJ, verbis:

“A Fazenda Pública pode substituir a certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da sentença dos embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal, vedada a modificação do sujeito passivo da execução”.

Frise-se que a súmula, ao se referir a erro material ou formal, não admite a possibilidade de modificação do lançamento, mas tão-somente do transporte das informações referentes ao aspecto material e ao aspecto formal da inscrição em dívida ativa. Nesse sentido: “não se admite a substituição da CDA para a alteração do sujeito passivo dela constante, pois isso não se trata de  erro formal ou material, mas sim de alteração do próprio lançamento” (REsp nº 829455/BA, Rel. Min. Castro Meira, DJ 07.08.2006).

Pois bem. In casu, constatou-se, no curso do processo, o falecimento do contribuinte ocorrido muito antes do ajuizamento da ação, mais precisamente em janeiro de 2005.

Deveria a Administração Fazendária, ante a constatação do óbito do contribuinte, ocorrido antes inclusive da inscrição em dívida ativa, proceder à emissão de nova CDA, com a precedência dos atos administrativos próprios, o que garantiria a observância integral do devido processo legal.

Ressalte-se, nesse aspecto, que segundo o que prevê o art. 131, I do CTN, configura-se a responsabilidade pessoal do espólio apenas no que  se refere aos tributos devidos pelo de cujus até a data da abertura da sucessão. Se os tributos devidos se referem a exercícios posteriores à data do óbito, como na hipótese sob julgamento, trata-se o caso de responsabilidade pessoal dos sucessores (art. 131, II do CTN), que deverão figurar na CDA como contribuintes-devedores, não devendo prevalecer a inscrição do débito  em dívida ativa efetivada contra o contribuinte falecido. E outro não é o entendimento do C. STJ sobre a matéria:

“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL PROPOSTA CONTRA DEVEDOR JÁ FALECIDO. CARÊNCIA DE AÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. ALTERAÇÃO DO PÓLO PASSIVO DA EXECUÇÃO PARA CONSTAR O ESPÓLIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 392/STJ.

O exercício do direito de ação pressupõe o preenchimento de determinadas condições, quais sejam: a) a possibilidade jurídica do pedido; b) o interesse de agir; e c) a legitimidade das partes. No caso em análise, não foi preenchido o requisito da legitimidade passiva, uma vez que a ação executiva foi ajuizada contra o devedor, quando deveria ter sido ajuizada em face do espólio. Dessa forma, não há que se falar em substituição da Certidão de Dívida Ativa, haja vista a carência de ação que implica a extinção do feito sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil. O redirecionamento pressupõe que o ajuizamento tenha sido feito
Mesmo quando já estabilizada a relação processual pela citação válida do devedor, o que não é o caso dos autos, a jurisprudência desta Corte entende que a alteração do título executivo para modificar o sujeito passivo da execução não encontrando amparo na Lei 6.830/80. Sobre o tema, foi editado recentemente o Enunciado n. 392/STJ, o qual dispõe que “A Fazenda Pública pode substituir a certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da sentença de embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal, vedada a modificação do sujeito passivo da execução”.

Naturalmente, sendo o espólio responsável tributário na forma do art. 131, III, do CTN, a demanda originalmente ajuizada contra o devedor com citação válida pode a ele ser redirecionada quando a morte ocorre no curso do processo de execução, o que não é o caso dos autos onde a morte precedeu a execução. Recurso especial não provido”. (STJ, RESp 1.222.561, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 04.2011).

Há, ainda, outros precedentes quanto à matéria:

“EXECUÇÃO    FISCAL           DEMANDA    AJUIZADA    CONTRA EXECUTADO      JÁ      FALECIDO              ILEGITIMIDADE      PASSIVA RECONHECIMENTO   CARÊNCIA DA AÇÃO   NECESSIDADE. Sendo a execução fiscal ajuizada contra devedor já falecido, o processo deve ser extinto por ilegitimidade de parte art. 267, VI, do CPC , não havendo como a demanda prosseguir contra que a relação processual tenha sido constituída com o preenchimento das condições da ação e dos pressupostos processuais. RECURSO     IMPROVIDO”     (TJSP,   Ap.   s/   Rev. 0508054- 93.2008.8.26.0590, 18ª Câm. de Direito Público, Rel. Des. Carlos Giarusso Santos, j. 09.05.2013).

“Apelação. Execução Fiscal. IPTU. Executado falecido antes do ajuizamento da ação. Aplicação do art. 131, incisos II e III, do CTN. Impossibilidade de substituição do polo passivo com inclusão dos sucessores em razão de vício na propositura da ação. Recurso Desprovido” (TJSP, Ap. nº 0501187-29.2007.8.26.0361, 18ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Roberto Martins de Souza, j. 15.12.2011).

“EXECUÇÃO FISCAL – APELAÇÃO – AÇÃO PROPOSTA QUANDO JÁ FALECIDA A PESSOA APONTADA COMO EXECUTADA – INTELIGÊNCIA DO ART. 131, INCISOS II E III, DO CTN -IMPOSSIBILIDADE DE INCLUSÃO DOS SUCESSORES NO POLO PASSIVO EM RAZÃO DE VÍCIO NA PROPOSITURA DA AÇÃO NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO” (TJSP, Ap. nº 0602048-57.2007.8.26.0091 18ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. José Luiz de Carvalho, j. 10.11.2011).

“EXECUÇÃO FISCAL. EXECUTADO. FALECIMENTO ANTERIOR À PROPOSITURA DA AÇÃO. CONDIÇÕES DA AÇÃO. AUSÊNCIA. Sendo noticiado o falecimento do executado e demonstrado que o óbito se deu anteriormente à propositura da ação, claramente ausentes as condições da ação, tendo em vista que, por óbvio, o falecido não pode ocupar o polo passivo da ação executiva” (TJMG, AC nº 1.0024.04.468530-3/001, 6ª Câm. Cível, Rel. Des. Antônio Sérvulo, DJ 22.07.2008).

“APELAÇÃO CÍVEL – EXECUÇÃO FISCAL – ÓBITO DO CONTRIBUINTE ANTES DO FATO GERADOR – ILEGITIMIDADE PASSIVA – EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO – IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL – DESPROVIMENTO DO RECURSO” (TJMG, AC 1.0079.08.419590-2/001, 2ª Câm. Cível, Rel. Des. Roney Oliveira, DJ 06.09.2011).

Assim, como bem reconheceu a d. autoridade sentenciante, inafastável era mesmo o reconhecimento da carência da ação com fulcro no art. 267, VI, c/c art. 598, ambos do CPC, o que impede que haja o prosseguimento da execução em face dos responsáveis, eis que, para que o pretendido  redirecionamento possa ser realizado, é necessário que a relação processual tenha sido constituída com o preenchimento das condições da ação e dos pressupostos processuais, o que inocorreu na espécie.

Por fim, em relação à condenação aos ônus sucumbenciais, nada há que se modificar, vez que o § 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil preceitua que nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, considerando-se o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado bem como o tempo exigido para o seu serviço. Esse, aliás, é o entendimento jurisprudencial:

“EXECUÇÃO FISCAL – Exceção de Pré-Executividade – ISS, exercícios de 2002 e 2003 – Município de São Paulo – Requerimento de extinção da execução – Comprovado o exercício de defesa, são devidos honorários advocatícios – Não aplicação do disposto no artigo 26 da Lei n° 6830/80, por não se tratar de cancelamento da dívida ativa – Verba honorária corretamente fixada – Sentença mantida – RECURSO IMPROVIDO” (Ap. nº 7800555800, Rel. Des. Rodrigues de Aguiar, 15ª Câmara de Direito Público, j. 03.07.2008).

Posto isto, nego provimento ao recurso.

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